Variantes linguísticas ou a riqueza do património imaterial

Ainda sobre o betacismo – “troca do som v por b ou, mais precisamente, pronunciar todos os sons (b e v) como b – nesta foto podemos ver o exemplo que dei no texto anterior acerca da não existência da letra v no alfabeto latino e lá está o v com o som de u:

Aqvi apareceo nossa senhora da ora lovvado seja o sanctissimo sacramento

( aqui apareceu a nossa Senhora da Hora louvado o santíssimo sacramento)

A partir do séc. XVI, com a introdução das letras “j” e “v” no alfabeto, a par das mudanças políticas decorrentes não só da reconquista cristã (que promoveu o contacto com a língua e cultura árabes) mas também com a ascensão da segunda dinastia ( Dinastia de Avis ) – que tirou o protagonismo à nobreza do norte de Portugal – e com a transferência do poder para o centro do reino, a variante falada nessa zona tornou-se o padrão culto da língua e as variantes do Norte perderam a sua influência.

“(…) as linguistas Maria Alice Fernandes e Esperança Cardeira admitem, aliás, que essa nivelação ’pode ter sido consciente e visado o distanciamento face às variantes setentrionais, portuguesa e galega’. Tratava-se, com efeito, sublinham as autoras, da ‘construção de um símbolo identitário próprio da dinastia reinante – a Casa de Avis’.”

Claro que estas mudanças não se fazem por decreto, a memória dos povos não se apaga e as fronteiras não são muros altos que os separam – até hoje, a proximidade histórica e geográfica do norte de Portugal com a Galiza preservaram características do falar antigo.

Esta proximidade é ainda hoje muito concreta e interessante – as pessoas da minha região de origem – Minho – entendem perfeitamente o galego e os galegos entendem-nos perfeitamente a nós.

Aliás, conto rapidamente um pormenor curioso: quando era criança, na minha zona, era mais fácil apanhar sinal da televisão espanhola do que da portuguesa e eu via os desenhos animados, daquele tempo, todos dobrados em castelhano – eu não sabia na altura, mas esse bilinguismo informal, veio a ser muito útil anos mais tarde na minha vida profissional.